sábado, 30 de outubro de 2010

As caixas

Tirei a aliança do dedo e coloquei-a de volta naquela caixinha de veludo preto, onde tempos atrás, ela reluzia nova e cheia de promessas.

Agora, de volta à mesma caixinha, o brilho já se faz diferente pelos arranhões das marcas de uso e pelos sonhos interrompidos.

No mesmo instante, veio a minha cabeça a imagem de meu cunhado, naquela tarde de novembro, abrindo as mãos postas em oração para me entregar a aliança de seu irmão como quem entrega seu próprio coração.

Olhei novamente aquela visão – as duas alianças lado a lado – ali, naquela caixinha de veludo preto, e, com uma certa pressa de quem não quer se arrepender, guardei aquele pequeno cofre na Caixa das Lembranças do Papai, onde estão as entradas para um jogo, cartões de aniversário com a letra dele escrita, algumas fotos, relógios, os aviõezinhos de chumbo, alguns outros carinhos e até um punhado de cheiros para o pequeno descobrir com o tempo.

Escolhi a prateleira mais alta e empurrei a Caixa das Lembranças para o fundo do armário e fechei a porta.

Talvez façamos assim com alguns de nossos sentimentos: a gente coloca em uma caixa, dentro de outra, na prateleira de cima, no alto do armário, atrás de uma porta fechada, lá no fundo da alma... Onde ninguém mais pode alcançar.

Um comentário:

  1. Veja que os arranhões na aliança foram causados pelos sonhos realizados juntos e pela busca dos interrompidos. Não são apenas marcas de uso. São marcas de muito bom uso! O que a gente queira é que a aliança se gastasse toda nesse uso, não? Que ele nos oriente a gastar mais (e bem) as alianças que temos. Um beijo.

    ResponderExcluir