quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Desmedida dor

Muitas vezes me perguntei qual dor é mais pungente, quem tem mais direito a sofrer sem cessar, a ser compreendida sem escutar: A menina que tem o coração partido pelo primeiro amor, a esposa que perde o marido, o pai que perde o filho, o filho que cresce sem pai?

Ou quem tem outras dores escondidas por debaixo da vida tranqüila e normal?

Dei-me conta que não há como mensurar ou comparar a dor. Ela é sentida na proporção das histórias de cada um, são expressas de formas irregulares e refletem – ou por vezes escondem - as dores que vão ao peito.

Não chorar pode ser muito sofrer.

Não mais falar sobre o que já passou pode ser muito sofrer.

Engajar-se no cotidiano pode ser muito sofrer.

E de tal forma, e tanto, que não há como julgar nem muito menos saber.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A gênese

Há de se entender que, perder alguém assim, é perder muitas coisas ao mesmo tempo. É perder o motorista, o contador, o amigo, o namorado... É perder o ombro e o chão, é perder as pernas e o caminho... é perder-se por inteiro...

Recomeçar, como?

Pela gênese, pelo renascer, é aprender e viver.

domingo, 14 de novembro de 2010

A Morte não é Nada, por Santo Agostinho

"A morte não é nada.
Eu somente passei
para o outro lado do Caminho.

Eu sou eu, vocês são vocês.
O que eu era para vocês,
eu continuarei sendo.

Me dêem o nome
que vocês sempre me deram,
falem comigo
como vocês sempre fizeram.

Vocês continuam vivendo
no mundo das criaturas,
eu estou vivendo
no mundo do Criador.

Não utilizem um tom solene
ou triste, continuem a rir
daquilo que nos fazia rir juntos.

Rezem, sorriam, pensem em mim.
Rezem por mim.

Que meu nome seja pronunciado
como sempre foi,
sem ênfase de nenhum tipo.
Sem nenhum traço de sombra
ou tristeza.

A vida significa tudo
o que ela sempre significou,
o fio não foi cortado.

Porque eu estaria fora
de seus pensamentos,
agora que estou apenas fora
de suas vistas?

Eu não estou longe,
apenas estou
do outro lado do Caminho...

Você que aí ficou, siga em frente,
a vida continua, linda e bela
como sempre foi."
 
                                                                                             Por Giovanna Leal
 
 
Hoje faço do silêncio uma outra forma de amar.
 
Me confundo com o que devo deixar para trás e o que, por direito, posso manter no peito, sem me machucar.
 
O que ele foi, vai continuar sendo... O que um dia eu fui, nunca mais será...

sábado, 30 de outubro de 2010

As caixas

Tirei a aliança do dedo e coloquei-a de volta naquela caixinha de veludo preto, onde tempos atrás, ela reluzia nova e cheia de promessas.

Agora, de volta à mesma caixinha, o brilho já se faz diferente pelos arranhões das marcas de uso e pelos sonhos interrompidos.

No mesmo instante, veio a minha cabeça a imagem de meu cunhado, naquela tarde de novembro, abrindo as mãos postas em oração para me entregar a aliança de seu irmão como quem entrega seu próprio coração.

Olhei novamente aquela visão – as duas alianças lado a lado – ali, naquela caixinha de veludo preto, e, com uma certa pressa de quem não quer se arrepender, guardei aquele pequeno cofre na Caixa das Lembranças do Papai, onde estão as entradas para um jogo, cartões de aniversário com a letra dele escrita, algumas fotos, relógios, os aviõezinhos de chumbo, alguns outros carinhos e até um punhado de cheiros para o pequeno descobrir com o tempo.

Escolhi a prateleira mais alta e empurrei a Caixa das Lembranças para o fundo do armário e fechei a porta.

Talvez façamos assim com alguns de nossos sentimentos: a gente coloca em uma caixa, dentro de outra, na prateleira de cima, no alto do armário, atrás de uma porta fechada, lá no fundo da alma... Onde ninguém mais pode alcançar.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Também choro!

Vejo-o me olhando de soslaio enquanto me apronto para o trabalho.

Assim que termino de calçar os sapatos, ele se aproxima, pousa a cabeça nos meus joelhos:

- Mamãe, “num” vai... Eu “choiu”...

...Ah, nada como se sentir amada!

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Noites e Dias

Estranho é não reparar mais nas colchas desfeitas em apenas um lado da cama... Como uma linha invisível, separa o que foi do que é, sem, contudo, impedir que estes se deitem juntos todas as noites.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Ao P.A., com P.S.

Jogou a bola, mas foi sua alma que se arremeteu aos céus. Deve ter entendido naquele instante o que havia acontecido, pois apesar do que aparentava, sua existência só podia ser antiga como as questões que carregava.

Deve ter sorrido com os olhos por que não era de se lamentar e mantido aquele expressão emblemática nos lábios de quem tem sempre uma posição a tomar.

Por dentro deve ter pedido desculpas por fazer chorar aos que o amavam... Ele sempre se importava com os outros.

A gente não se via há muitos anos.

Formados, fomos ganhar a vida conforme manda o protocolo. E a amizade ficou no tempo, esperando um telefonema, um café ou uma vodka acompanhada de conversas mal desenhadas, perguntas inquietas, soluções não definidas, situações inusitadas.

Não conheci sua esposa, ele não conheceu o meu marido... Perdemos parte de muitas histórias, mas não a certeza de se ter aquele amigo de verdade.

Ah, Paulo! Não te contei como conheci um primo seu junto com uma dinamarquesa em plena Praça de Maio, na Argentina.

Se encontrar Élcio por aí, neste lugar que meu coração gosta de sonhar que é onde vocês estão, se apresenta, vocês se darão bem, e ele te conta como foi...

...Ou eu mesma conto, quando for a hora.


P.S: Não faça Tom e Vinícius ficarem até altas horas a declamar poemas... Eles já têm certa idade, meu amigo, e você, é tão jovem!

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A marca

Dentre as muitas coisas que estou aprendendo - recomeçar implica em aprender novos truques - uma delas é a de me ver acompanhada de mim e isto ser bom e não somente solitário.

Muitas coisas mudaram e lidar com estes novos sentimentos que não entendo, requer, entre outras coisas, uma convivência saudável entre minha ex-vida e minha vida atual... As coisas não voltam ao seu devido lugar e é preciso aceitar este fato.

A morte levou, sim, um pedaço de mim... custei a entender isso, não queria me ver transformada por algo que não fosse bom, mas não há como passar por isto e não ser modificada.

Sei que se foram muitos dos meus sonhos, das minhas crenças, esperanças, certezas. Ela levou o resto da inocência de adolescência que tinha e que no fundo, me fazia acreditar que éramos imortais. Levou meu mundo rosa onde as famílias são todas compostas de pais, mães e filhos.

Mas a morte não levou minha capacidade de amar, de sorrir, retribuir e sonhar novamente. Não levou minhas alegrias assim como não levou meus medos.

E é deste emaranhado que recosturo a minha vida.

Sou agora a mãe sozinha com o filho adoentado no hospital, sou aquela que carrega as malas, faz as compras, paga as contas, escolhe a escola, planeja as férias, guarda as fotos.

Se é assim, que seja inteiro e em paz.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Dia sem dia

Preciso lembrar de fazer as pazes com os sábados... estão fazendo uma falta danada no meu calendário!

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Meu último primeiro dia

Foi-se o Natal e o Ano Novo. Assisti passar aniversários e datas que comemorávamos juntos, sem ter, pela primeira vez em anos, um abraço companheiro a me presentear. (...de fato, sempre me apaixonei pelas coisas boas da rotina.)

Estes “primeiros dias de alguma data” são difíceis, são como os primeiros sete dias de luto, só que espalhados pelo ano que se segue e em um número maior que sete.

É estranho como, de um modo geral, a gente se prende a estes detalhes e aguarda uma primeira data como um horizonte a percorrer, como um dia de compromisso marcado a que devemos comparecer.

Mas não é só a isto que se resume este ato, e, ao contrário do que possa parecer à primeira vista, não é um aguardar obscuro pelo “primeiro aniversário” ou “primeiro Dias das Mães”. É um voto de esperanças pelos dias que se seguem a estes, certeza que, se o primeiro é o mais cruel, passar por ele é enxergar os dias que vêm depois, de vida e sentido.

Assim foi Dia dos Pais.

E como as outros "primeiros dias", senti meu peito apertar até quase sufocar.

E quando acabou, dei de cara comigo mesma, satisfeita, por não ter mais nenhum primeiro dia já marcado na folhinha a me espreitar.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Muitas trajetórias

Um homem parte e deixa
a sua roça
a sua cria
- e outra mão colhe
no vazio da perda.
Elias José. In: Trajetória.

Acredito na colheita mas é preciso paciência e disciplina.

Sou eu que traço minha trajetória, isto é inegável.

Sou eu que decido como agir diante do imutável, isto é necessário.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Por dentro e por fora

Para quem vê, calmaria e tranquilidade. Aqui na alma, tormento e tristeza. Queria que por vezes que estes mundos se invertessem: o que vai por fora se transportasse para dentro. O que vai por dentro explodisse para fora.

Depois seria só equilíbrio.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Outra despedida

O pai dele se foi três meses depois de sua partida. Na minha mente fica a imagem de seu sorriso matreiro a passos largos ao encontro do filho. Não importa a doença que o tomou:  foi a tristeza que o apressou.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Conversas infantis

- Dinda, o tio morreu.

...Ele me disse assim, dia desses, com a sabedoria de seus cinco anos, sem rodeios nem histórias de pessoas que viram estrelinhas ou que foram morar no céu.

- Verdade.

...Respondo, meio encabulada, sem entender de onde vem esta coragem em falar com simplicidade algo tão complicado.

- Naquela foto o seu sorriso era feliz. Agora é triste.

...Continua ele com uma voz professoral de quem tem que me explicar algo que ainda não entendi.

- Vou melhorar. Já estou quase lá.

...Respondo mais uma vez com uma ponta de medo de não ser bem assim.

- Tá bom, acredito.

E me olha desconfiado e muda de assunto.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Um presente escrito

Passou à muito pouco o seu aniversário de dois anos, meu filho. Bem pertinho mesmo. Fiquei às voltas em pensar no presente perfeito e na festinha colorida para ver seus olhinhos brilharem de alegria.

Junto à estas tarefas que desempenhei com carinho, evitei pensar no seu primeiro aninho sem o papai a lhe segurar para apagar a velinha. E foi tamanha a sua felicidade que, realmente, me vi feliz de verdade.

Mas ainda queria lhe dar um presente, meu filho, algumas histórias de seu pai, para que você o conheça mais e assim conheça a você mesmo. Por que somos muito disto, meu filho, somos parte de nossos pais e de suas histórias.

- Seu pai tinha uma memória prodigiosa para números. Sabia CPF´s, RG´s, datas, senhas, e se necessário, guardava até um código de barras inteiro... mas nunca se lembrava onde tinha colocado as chaves do carro ou os óculos de sol.

- Ele me puxava para seu colo com estardalhaço, falando que eu era dele, só para ver você vir correndo e pedir colo também. E a gente ficava ali, empilhados em um abraço demorado.

- Ele foi o primeiro a te segurar, a te trocar, o primeiro a te dar banho, a te embalar. Seguiu você pelo hospital com medo de alguém te perder.

- Ele levantava bem cedinho, caindo de sono, para te pegar ainda dormindo no berço e o trazia para nossa cama, sem se preocupar com as regras modernas da puericultura. Era só gosto bom de família.

- Ele perdeu a mãe cedo, conhecia esta dor. Mas voltou a gostar do dia das mães depois que você nasceu.

- Acho que ele era bem levado quando criança, filho, mas isso não sei ao certo. Cortou o pé de “ora pro nobis” da Vovó Sãozinha por que tinha espinho. Arrancou uma lasquinha da mesa nova porque precisava de um palito.

- Era cruzeirense, e como sou atleticana, brincava que casou primeiro e só perguntou depois.

- Ele queria menino. Queria você. Escolheu seu nome.

- Ele te beijou, filho, bem demorado, antes de sairmos naquele dia.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

O Encontro

Conheci-o pessoalmente um dia depois de seu aniversário.

Eu, decepcionada com as paixões. Ele, farrista assumido.

Começamos como estes casais modernos, via internet. Mantivemos um pé no tradicionalismo mineiro com uma amiga nos apresentando formalmente, por email, com fotos e votos de se comportem.

Ele não gostou do que viu. Eu salvei a foto dele para verificações futuras.

Eu, em Bauru, ele em Brasília, a cupida em outro lugar do mapa.

Já no encontro cara a cara, sem tempo para pensar na melhor escrita, eu olhei desconfiada para aquele rapaz com os olhos espantados. Ele confessou tempos depois, que o susto vinha da descoberta que, afinal, eu era diferente do que tinha imaginado.

Pequenas mentiras de sedução, um amor honesto dentro do peito e três meses depois falávamos em casamento.

Eu, assustada. Ele, decidido.

Mas precisaram se passar mais alguns meses e minha profissão cigana me mandar para o frio do sul até a escolha de nossa primeira casa.

Nos sentíamos unidos, inteiros e amigos. Era bom e feliz.

Sincero e tão completo em suas perfeições e imperfeições que me transformou e me resgatou.

Depois dele e mesmo agora que se foi, voltei a acreditar nas relações. Nos amores possíveis. Na vida a dois. Mesmo quando minha alma escurece e chove aqui dentro de mim.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Soneto da Separação

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Vinícius de Moraes

...Muitas vezes, as palavras faltam e lançamos mão das que não são nossas, as de verdadeiros poetas que, com um olhar de almas antigas têm o dom de nos traduzir quando nós mesmos não conseguimos.

terça-feira, 8 de junho de 2010

A fé me sustenta. Uma fé maior do que eu jamais imaginei. Ela me apóia e me faz acreditar no amanhã.

Fé em Deus, na vida, em mim. Força.

Sempre fui uma pessoa de fé. Ela não passou a existir para aplacar o meu sofrimento, mas apropriou-se de mim, cotidianamente, sustentando-me e mostrando-me motivos para continuar.

(Acho que sem uma crença em algo maior, em um propósito, a vida vira beco sem saída...)

Sou nascida católica, mas sempre questionei as religiões, já que acredito serem elas dos homens, que são falhos e muitas vezes usam-na para interesses outros.

Mas independente destas, acredito na existência de Deus, na Sua presença em minha vida. Sinto-me abençoada mesmo agora, quando encaro os meus temores palpáveis.

Esta fé em Deus permite-me não entender.

Simplesmente não aceito. E está tudo bem.

Não sei como aceitar a partida de alguém que julguei não existir, que amei por escolha e que me retribuiu na mesma medida.

Aceitar é compreender que tinha de ser assim, e eu não estou pronta para isso.

Não entendo o porquê de ter sido naquela manhã, sem avisos nem rodeios, de ter sido conosco, de não ter tido a chance de me despedir.

E, estranhamente, sinto que é justamente na falta desta aceitação ou compreensão que reforço a minha fé.

Acredito que Deus está por perto, que vai cuidar de mim para que eu possa viver e ser feliz, mesmo não entendendo ou aceitando o que, no fim, não saberei as respostas.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Para todo fim, um recomeço

Mesmo para os que não desejamos. Mas sou eu que escolho empregar energias em um dos pólos: o fim ou o recomeço.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Maior amor do mundo

Vejo seus passos, a cada dia mais firmes, percorrerem a casa, e com eles uma alegria esparramada por todos os cantos, acompanhada de sonoras risadas de bebê de propaganda de fraldas descartáveis.

É um adorável mundo novo que se mostra a minha frente, a cada nova palavra e expressão de vontade, nas descobertas e nas pequenas frustrações de seu cotidiano de menino.

Este pedaço de mim traz no semblante muito de seu pai, e com ele a passagem por esta fase de dor pungente tem sido mais leve, menos difícil, com um sentido diferente dos que tomei para mim.

É meu mar de felicidade em meio a esta ilha de tristeza.

Por ele evito deixar me tomar pelos medos que me assombram, muitos dos quais acredito que a maioria das mães sentem, mas potencializados com a inevitável preocupação com as experiências que irei passar sozinha, das perguntas advindas das faltas rotineiras que a ausência traz, de como ensiná-lo sobre a morte muito antes de conseguir lhe falar sobre a vida.

Receio o pedido de explicação sobre onde, porque, como e para onde seu pai se foi, e já prematuramente busco forças e as palavras corretas para que o entendimento não seja amargo... mas queria mesmo era protegê-lo de dar estas respostas para outras pessoas e situações corriqueiras que, se hoje já rondam minha vida, certamente estarão presentes na dele.

Vejo-o forte e feliz, independente dos meus medos, incertezas e fraquezas, mostrando-me que possui sua própria trajetória e saberá conviver – provavelmente até melhor que eu – com a vida que se mostra tal qual ela é, completa, linda, alegre e também com suas dores.

Todos os dias pego-o nos braços, mas é ele que me aconchega no seu colo...

terça-feira, 18 de maio de 2010

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Anjos sem asas

Gosto da definição de que amigos são anjos sem asas...

E a certeza me veio durante estes seis meses. Esta metade de um ano em que tive sempre a mão os ombros estendidos de vários amigos – e fico feliz de poder chamar a minha família e a dele de amigos também.

Algumas destas pessoas vieram da minha vida, outras tantas da dele para minha.

Uns não me conheciam, outros não o conheceram, mas depois que ele se foi, permanecem em minha vida e na do pequeno de forma espetacular, como um movimento sincronizado de pássaros voando em bando.

Estas pessoas nos envolveram e nos acolheram e, como um casulo, as vejo tentando nos proteger até a transformação para uma nova etapa, de forças restituídas e sonhos arejados.

Não sabia que eram tantos nem que sua força era tamanha. Alguns nem sabia serem meus amigos.

Foram tantas palavras doces, tantos pequenos e grandes gestos... Uma pausa para o café, uma ajuda na tarefa inacabada, um abraço, uma gargalhada, uma piada, telefonemas de como vai seu dia.

Estas amizades, no momento da dor, não tentaram evitá-la, não se encabularam com um olhar que ficou perdido, uma frase pela metade, um humor ácido, lágrimas que insistiram em cair.

Elas somente ficam ali, observando, esperando passar, sem cobranças, vigiando para que o caminho não se perca, mesmo mantendo a fé que isto não vá acontecer.

Um compartilhar de sensações, sem tentar preencher o vazio que ficou. Um sufocar de suas próprias dores, para que as minhas possam se curar.

Naquele sábado, quando cheguei em casa, muitos destes anjos já estavam lá. Outros foram chegando com o correr do dia, e mais outros, no decorrer dos meses.

Alguns voltaram do meu passado, alguns de partes da vida dele que eu não vi.

Uns saíram de longe para um abraço, um colo. Uns sofreram pela conversa saudosa pelo telefone ou email que não permite o contato desejado no frio que a distância traz.

Não me senti só, pois nenhum amigo me faltou.

Sinto que todos estão aqui, com suas enormes asas.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Tempo mano velho

2009 foi um ótimo ano: fomos felizes.
2010 tem sido uma ponte para 2011, uma passagem, muitas conquistas, alegrias, dor e saudades.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Vazios

Posterguei a retirada das coisas dele de casa, por não ter pressa, por não querer mais nenhuma mudança na minha vida já tão revirada.

Simplesmente deixei para depois.

Sabia que o momento certo chegaria.

E foi assim, sem planejar nem fazer preparativos que, quando dei por mim, estava às voltas com suas coisas espelhadas pelo quarto.

Executei esta tarefa dolorosa, vi mais um pouco dele de partida e senti minha dificuldade em deixar que isto aconteça.

Sei que é irracional, mas estes sentimentos são tão vastos que é complicado entender até para quem os sente.

Muitos correm a limpar os armários, acho que para tentar acelerar o processo de cura, de luto. De cura do luto.

Eu precisei de tempo, e quando este chegou, foi mais fácil.

O que não me impediu de sentir os cheiros que trouxeram as lembranças que me invadiram e com elas, saudades.

Vi vazios se formando nas gavetas e os que ainda estão dentro de mim doeram mais fundo, mas senti que já tenho forças para construir novos espaços, novos caminhos, novos projetos de vida que sejam meus, que sejam para meu pequeno enquanto esta for minha tarefa.

Algumas coisas vão continuar onde estão. É minha escolha.

Outras, como a aliança que carrego no dedo, o tempo irá levar, mas só quando o meu tempo chegar.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Estado de Viuvez

Ser viúva não só um estado civil mas também um estado de espírito: você não tem mais o compromisso assumido com uma pessoa entretanto não deseja largar de tê-lo.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Carta para você!

Amor,

Tento escrever uma carta para você, como se você ainda estivesse aqui só para fazer algo que não fiz quando havia oportunidade.

Não consegui. A realidade é outra. A chance se foi.

Eu não posso mais te dizer coisas que pensava, eu não posso ouvir suas respostas.

Queria ter te falado mais sobre o amor que sentia, já que nunca é demais falar sobre isso, mas também sobre outros sentimentos, angústias e fraquezas, que achei sendo meus, não deveriam ficar expostos.

Nunca tive coragem de lhe contar do medo que sentia de te perder, escondi-o até de mim.

E é duro ver nossos medos tornarem-se reais.

Acreditei que tudo viria com o tempo e a seu tempo. O que eu não sabia era que este é que era limitado.

Conhecendo-me, assusto ao ver que não parti com você.

Mas que não continuo a mesma.

Olho para esta pessoa estranha que busca forças e as encontra não se sabe onde, que ri e se fecha e não a reconheço. Nem sei se você ia gostar dela. Espero que ela melhore.

Para me resgatar, fixo a mente nas muitas lembranças.

Elas me acompanham, boas, doces, amargas e felizes, desta época em que pude compartilhar com você uma vida inteira dentro de um curto espaço de tempo.

Não são muitas as pessoas que juntam as palavras casamento e felicidade em uma só frase. Alguns nem as têm.

Eu as tive e isso é muito.

E.

PS.: Ao nosso quinto ano, com o mesmo amor do primeiro!

quarta-feira, 14 de abril de 2010

5 meses

A música do carro não toca alta o suficiente naquela curva a caminho de casa.

Queria que o som evitasse o mesmo pensamento de presságio e agonia que me assalta todos os dias, nestes cinco meses que nos separam.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Burocracia

Existe sim uma burocracia enorme pós-morte que, se sozinha já me traz grande descontentamento, piora ao verificar que junto a esta, assisto, resoluta, a vida dele ser reduzida a números, laudos, dados, datas e protocolos.

Esta burocracia começou exatamente no mesmo instante em que se instalou o sofrimento, veio insensível, trazendo seus prazos a serem cumpridos, papéis a serem entregues, cartórios e carimbos que ignoram os meus sentimentos e minha necessidade de ar.

Neguei ao máximo estas tarefas, talvez na esperança que, de alguma forma, ele voltasse para seu CPF e para mim.

Entretanto, mesmo com a ajuda de tantos queridos amigos e parentes que tentaram realizá-las, sempre é preciso da minha assinatura, do meu consentimento ou minha orientação.

No final, não consegui fugir.

E tenho que repetir meu indesejado recém adquirido estado civil e minha história para um nem sempre amigável atendente, que não percebe o esforço e a batalha interna para estar ali...

Semana passada, mais uma vez, dei entrada em outro processo.

Vi novamente a vida dele ali, exposta a uma desconhecida por detrás de uma mesa.

Desta vez, chorei envergonhada de ainda chorar nestas horas, me lembrando de que ele era mais que aqueles papéis, que tinha uma história que faz parte da minha e que luto para assegurá-la na de nosso pequeno.

Neste dia descobri que preciso, ainda, “averbar” minha certidão de casamento, voltar – pela terceira ou quarta vez – no cartório onde nos casamos para que alguém escreva que ele se foi, que sou viúva, que esta é minha nova história, oficial, carimbada, rotulada em quantas vias mais a burocracia solicitar.

segunda-feira, 29 de março de 2010

sexta-feira, 26 de março de 2010

Sobre ele

Calça jeans. Blusa social clara, mangas compridas dobradas perfeitamente até à altura dos cotovelos. Sapato social.

Andar macio, de quem pisa com o pé todo, consciente de cada passada. Sem pressa.

Coluna ereta. Ombros largos. Peito aberto de quem fica com o coração exposto.

Cavanhaque. Olhos castanhos claros, que ele jurava que podiam ficar esverdeados e eu ria desta possibilidade. Óculos escuros.

Cabelos curtos com entradas e uma pequena mecha de fios brancos que vi surgir, que ele dizia ter meu nome, que eu não pude ver se espalhar por sua cabeça.

Cheirava a perfume bom. Ou a nada.

Falava baixo ao telefone, gritava em dia de jogo.

Risada forte, de sacudir o seu corpanzil, largo e alto.

Era emotivo. Chorava comigo e por mim. Sabia pedir desculpas e tentou me ensinar o mesmo.
Amável. Brincalhão. Divertia-se com tudo, se esbaldava no sorriso do filho. Dizia que se perdia no meu.
Pai, com toda a força da palavra. Brincava se arrastando pelo chão, de cavalinho, ou qualquer coisa que o pequeno quisesse.

Inteligente, matemático. Sincero.

Amigo. De seus amigos, dos meus, dos que ele ainda não tinha feito. Não tinha conhecidos. Tinha amigos. Era meu amigo também.

Mas de seu melhor amigo ele era irmão.

Cozinhava bem. E convidava. Gostava de casa cheia, sem se importar se no outro dia tinha que trabalhar.

Me amava. Me escolhia todo dia para sempre, mesmo depois de uma grande briga.

Era feliz e ponto.

Tinha defeitos, muitos. Mas hoje só quero lembrar as coisas que tenho medo de esquecer.

terça-feira, 16 de março de 2010

A culpa

Eu busco respostas... Para tudo, sempre busquei. Estoicamente. Não sou uma pessoa que se contenta com um "porque sim" ou "são coisas da vida". Não eu.

O problema é quando, na verdade, não existe uma resposta que caiba no tamanho das perguntas que me faço, nos porquês que levanto.

Mas mesmo assim, eu busco.

Conversei com médicos, fui à igreja, troquei de crença, questionei os desígnios, tentei terapia, e por fim e desde o começo, me culpei - muito, irracional e profundamente.

Achei a resposta em mim, por não ter vistos os sinais, logo eu que tenho um histórico familiar de muitos cardíacos, que leio e me informo... Por não ter insitido nos check ups anuais, por não ter corrido para o hospital quando ele falou do calor que sentia naquela manhã.

Culpei-me e não consigo não pensar nisso.

Mas racionalizo, me fundamento, não tenho poderes sobre a vida e a morte. Não tenho o amanhã, muito menos o hoje.

E assim tenho caminhado, tentando me desculpar racionalmente.

Por isso comecei a escrever, buscando as respostas que estão em mim, neste ato de perscrutar minh'alma, para me perdoar, para minar a dor e a saudade, para transformar este amor que, se antes completo, agora, inalcançável.

segunda-feira, 15 de março de 2010

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Imagem

Fico com medo de ser a figura triste que muitos imaginam para uma viúva. Quero ser felicidade.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

A Volta

Voltei ao trabalho fazia 15 dias de sua partida. Aqueles dias em casa me pareceram anos, a vida suspensa, esperando a porta abrir, ele ligar, eu acordar, algo mudar.

Me sentia sufocada, achando que uma parte de mim ia enlouquecer ao mesmo tempo que procurava manter uma certa serenidade, um lapso de dignidade aparente.

Foi instintiva a necessidade de recomeçar depressa, o quanto antes. Misto de urgência, de superar logo e de vontade de acabar com o vazio que toma conta de tudo.

Quis encarar a rotina que voltava, incompleta, mas estava alí, em um aceno de que a vida tinha e ia continuar, com ou sem a minha permissão.

Foi uma primeira reação a esta briga interna que se instalou dentro de mim, entre a vontade de me entregar à esta dor e o medo de me deixar cair a tal ponto que eu não achasse mais o caminho de volta... 
 
Acima de todos estes contrapontos, há sempre esta minha grande razão para lutar, meu bem maior: o meu filho, que dá sentido à todo este amor que ainda arde no meu peito.

É o entendimento que continuar não é significado de não sofrer. É o de não desistir.

Escolhi, então, deixar-me abater depois, quando tiver tempo. Já que estes sentimentos estão dentro de mim, me acompanham em qualquer lugar onde eu estiver e que não vão se perder.

A minha história certamente vai continuar sem ele, mas não tem como continuar sem mim.

Vale a pena, sempre.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Coisinhas que incomodam

Chegando em casa, cansada, pensando em alguma forma de encarar a noite sem chorar e continuar bem, bati meu carro.

Nada sério, mas o suficiente para me desmontar em lágrimas e pensar:

- Tem horas que não dá para filosofar: Tá F....A mesmo!

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

No Skype

5/10/2009, final de tarde...

[17:38:26] Erika: oi

[17:38:39] Erika: Precisa que eu arrume carona?

[17:38:51] Élcio: vou te buscar e volto

[17:39:29] Erika: Eu tento ver uma carona primeiro...

[17:40:13] Erika: Eu odeio horário de verão.

[17:40:24] Élcio: eu amo

[17:40:52] Erika: Ama nada.

[17:41:03] Élcio: eu amo vc

[17:41:17] Erika: Ah, bom...

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Dia desses...

Dia desses enchi o peito de coragem, apontei o mural e exclamei:

- Olha, filho, é o papai na foto!

E assim como eu, que o incentiva em suas pequenas conquistas, ele retribuiu, sorrindo, me aplaudiu, orgulhoso...

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Palavra

Só uma palavra me maltrata mais que viúva: órfão.

O Choro

No começo era o choro desmedido, pranto profundo, que sai de todos os cantos: coração, mente, corpo, alma.

De forma incontrolável, ele toma conta da gente, faz tudo girar, vira grito de dor, perdemos as forças... este choro suga a vida até o sono chegar, deixando o corpo entorpecido, a boca seca, a cabeça vazia.

Foi assim em algumas ocasiões...

 - No dia que ele se foi, na hora da constatação de que um vazio sem resposta tomaria conta de mim por muito tempo, de um pedido que não seria atendido, da solidão e da ausência já sentidos.

- Na semana seguinte, na casa de minha infância, onde não pude voltar para o útero de minha mãe e o abraço de meu pai não me protegia mais.

- Na primeira noite de volta a minha vida, naquele quarto onde dividíamos tudo, onde éramos só nós dois, onde fomos um, onde nos transformamos em três.

Mas logo em seguida conheci o pranto "de hora marcada", que chega no carro de volta do trabalho, na hora do banho, no escuro da noite quando acordo de madrugada. Este é mais sereno, com um controle de quem sabe que depois da curva tem que estar melhor, já sorrindo, sem querer que percebam para que não tentem te consolar...

Nesta época você aprende que não há consolo, o que existe é calma com a realidade.

Com os dias correndo, vem o choro da saudade. Não daquela que você imagina no começo, mas real, de tempo que passou... Saudade de abraço, de beijo, de boa noite e de bom apetite.

Agora sobrevivo ao pranto de assalto. Aquele que me pega distraída, de forma sorrateira, quando olho para o lado e vejo o bar de nosso primeiro encontro, quando floresce a orquídea ganha no meu aniversário, em meio ao trânsito, ao filme assistido juntos.

Este é mais cruel. Te desaba a qualquer momento. Ele vem para te lembrar que não, não passou e sim, é verdade.

Hoje choro todos estes prantos e me pergunto quantos mais ainda vou conhecer...

sábado, 16 de janeiro de 2010

Sonho

Hoje sonhei com ele.

No sonho, ele já não estava mais aqui, mas aparecia para mim... Só eu podia vê-lo, conversar, brigar, tocar, beijar.

Rotina.

Acho que é meu lado racional tentando achar uma saída para o que não tem retorno.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Meu aliado, o tempo

Quando estava grávida, já com uma barriga enorme, viajei a trabalho para São Luis do Maranhão. Era maio e foram 18 dias em que todas as manhãs, eu passava uma mensagem dizendo "Faltam x dias..." e ele respondia: "Bom dia, meu anjo!"

E as mensagens e telefonemas se seguiam até o "Boa noite", de saudade, carinho e vontade.

Era uma espécie de contador de recorde de "distância" com gosto bom, a cada dia que fiquei por lá... Rimos disso demais, não era desejado outros desse tipo.

Hoje penso nesta história e constato que agora quebramos este "recorde" a cada minuto, momento, segundo, pensamento... Só que agora o gosto é amargo e ríspido.

Hoje já está fazendo dois meses e só tem dois meses...É tão recente e é tanto tempo. Muito tempo para quem sente a falta, pouco para afogar a dor.

Queria voltar, nem que seja naquele dia, só para poder abraçá-lo mais uma vez. Queria avançar no tempo para amenizar esta dor presa no estômago, ardente, incessante, calada.

Levanto como em todos dos dias, escolho o preto para me vestir e então entôo o mantra: "Tudo vai ficar bem, vai ficar bem, vai ficar"... Acredito.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Onde tudo começou...

Era um sábado normal, de coisas cotidianas, de natação do bebê, de vida urbana, de festa à noite, de ver os amigos e arrumar as coisas de casa que estão pendentes...

Saí por 1 hora e quando voltei, minha vida tinha se transformado em um enorme redemoinho, nada mais seria como antes, por mais que eu consiga refazer a vida...

Ambulâncias na porta e uma palavra cruel me atravessou os ouvidos, a alma e meu coração: Morreu...

Não sei de onde veio a notícia, não percebi... somente corri... até um corpo já inerte, ainda quente e extremamente amado...

Como continuar sem aquele que elegi como meu par nesta caminhada? Como ensinar ao seu filho o porquê disso tudo, se eu não consigo entender?

Amor,

Tenho chorado, sofrido e vivido a realidade, e sinto que, desejo muito prosseguir, por nosso filho, por você e por mim...